SeMentes Brilhantes, combate a desigualdade no berço - Gláucia Maciel

Fonte: Valor Econômico, por Ligia Guimarães, de São Paulo, em 03/08/2015

Gláucia Maciel, idealizadora do SeMentes BrilhantesNo ano que vem, o desafio da empresária Gláucia Maciel será provar que as técnicas desenvolvidas por sua equipe para estimular o cérebro de bebês da elite paulistana podem ser usadas em larga escala pelas creches da rede pública. O projeto desenvolvido por ela, batizado de SeMentes Brilhantes, será testado em três comunidades carentes da cidade de São Paulo (Paraisópolis, Caxingui e Jardim Ester).

O projeto de Gláucia foi um dos dois desenvolvidos no Brasil selecionados pelo programa canadense Saving Brains (Salvando Cérebros, em português) e recebeu financiamento de 250 mil dólares canadenses (R$ 650 mil). O programa investe em ações inovadoras que protegem o desenvolvimento cerebral das crianças nos primeiros mil dias de vida.

Nas creches públicas definidas pelo projeto serão usados os mesmos kits e planos de aula da Steps Baby Lounge, centro de desenvolvimento infantil que Gláucia criou há 14 anos, com unidades instaladas nos bairros dos Jardins e Vila Olímpia. "Nos primeiros quatro anos de vida, 80% da referência neurológica do indivíduo é estabelecida, diz a empresária, que defende que o estímulo adequado nessa faixa etária amplia a capacidade de aprendizagem que a criança terá na vida adulta".

Se for comprovado que a ação tem impacto social e custo sustentável, o projeto da empresária poderá receber novo financiamento de 1 milhão de dólares canadenses, além de apoio para ganhar escala em parceria com o poder público. "Nosso objetivo final é criar um produto que vá caber no orçamento das creches públicas e conveniadas, para ter impacto social", diz Gláucia.

Segundo a empresária, o estímulo inadequado dos bebês é um grave limitador do crescimento intelectual, emocional e social na vida adulta. O ensino nas creches públicas e conveniadas, diz, é muito desigual e, em muitos casos, mais focado em "vigiar" a criança do que em estimulá-la adequadamente.

"A desigualdade social começa na primeira infância", afirma Gláucia. "Uma criança que não recebe estímulos adequados na creche vai ter dificuldades motoras, linguagem limitada, baixa autoestima, maior instabilidade emocional. Terá maior dificuldade de conseguir bons empregos e vai perpetuar esse ciclo de pobreza."

Pela metodologia adotada no projeto SeMentes Brilhantes, os bebês dividem o tempo entre atividades que estimulam psicomotricidade, expressão artística e sensibilidade musical, com brinquedos importados desenvolvidos especialmente para o uso educacional. Nessa etapa piloto, as três creches públicas receberão gratuitamente um kit com 200 brinquedos e 48 planos de aulas, além de treinamento para os professores.

O projeto será realizado em três creches com 220 crianças de um a três anos de idade e 26 educadoras nos bairros de Paraisópolis, Caxingui e Jardim Ester. Para testar a eficácia da tecnologia, uma equipe de pesquisadores da USP vai monitorar a evolução das crianças.

"Na área pública tem muita gente competente trabalhando nisso. Mas se conseguirmos, dentro da verba da creche, uma qualificação para dar aula de música, arte e psicomotricidade, vai fazer muita diferença para essas crianças e para as educadoras", diz Gláucia, que conheceu exemplos de creches em que as crianças passam o dia vendo televisão. "Isso limita o desenvolvimento neurológico", diz.

Esse não é o caso das creches que receberão o projeto piloto do SeMentes Brilhantes. As três unidades são geridas pela Associação Santo Agostinho (ASA), organização da sociedade civil sem fins lucrativos, que atende 1.450 pessoas e tem orçamento de R$ 11 milhões por ano, dos quais 70% vêm da prefeitura.

No dia em que a reportagem esteve na unidade de Paraisópolis, as crianças estavam aprendendo a cantar músicas de Chico Buarque e encenando peças que ensaiaram ao longo do semestre. "Buscamos sempre trabalhar um repertório diferente do que eles ouvem na realidade deles", diz a coordenadora geral das creches da ASA, Sueli Ferreira, que afirma que as educadoras estão animadas para participar do SeMentes. A aceitação também foi boa entre os pais das crianças que vivem em Paraisópolis. "Fizemos uma reunião e conversamos com todos antes de aceitar", diz a professora.

"Temos um projeto pedagógico seríssimo, feito em parceria com a Fundação Carlos Chagas e a Fundação Girassol. Já temos uma base científica, o que não é a realidade das outras creches públicas", diz Celia Tilkian, superintendente executiva da ASA. "A dúvida é: será que aqui o projeto vai ter o mesmo impacto que teria nas outras?", questiona Celia.

O presidente do Grand Challenges Canada, Peter Singer, diz que vê no Brasil enorme potencial para ações de impacto social na área infantil. Nas contas da entidade, o país tem 16 milhões de residências com crianças menores de seis anos. "Esses projetos inovam em relação a evidências que já existem sobre desenvolvimento infantil, mas aplicadas ao contexto local", diz o executivo.

Segundo Singer, as ações seguem uma tendência mundial no estudo sobre desenvolvimento infantil, cujo foco mudou. Antes dedicado à sobrevivência das crianças, "o objetivo agora é criar oportunidades para que prosperem e quebrem ciclos de pobreza", diz.

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