Formando cidadãos em Paraisópolis - Monica Tarragó

Fonte: Blog de Renata Spallicci, em 14/07/2016

Monica Tarragó e as crianças do Ballet ParaisópolisUm, dois, três, quatro. Um, dois, três, quatro. A voz firme, contando os compassos, ecoa na sala forrada com linóleo. As bailarinas se esforçam para buscar o movimento perfeito. Esforço, suor, dedicação, amor.

Cenas como essa se repetem, diariamente, nas mais variadas partes do mundo: dos aclamados Ballet Bolshoi de Moscou ou Joffrey Ballet de Nova Iorque até as pequenas academias de cidades interioranas. O ballet se renova dia a dia e, a cada instante, uma menina ou menino sonham em ganhar o mundo mostrando a sua arte.

E, se esse sonho era praticamente impossível para as crianças da comunidade de Paraisópolis, há quatro anos ele começou a se tornar realidade, graças ao desprendimento e à paixão de uma mulher: a bailarina e coreógrafa Monica Tarragó.

Bailarina com carreira internacional e professora no Teatro Nuevo de Torino, Itália, e de renomadas academias no Brasil, Monica resolveu encarar o maior desafio de sua vida, no ano de 2010, quando começou a desenhar o projeto que mudaria a vida de centenas de crianças.

“Escolhi Paraisópolis, pois via a Comunidade todos os dias e tinha vontade de ajudar. Além disso, a Comunidade de Paraisópolis estava muito organizada e estruturada para os projetos sociais”, relembra a bailarina.

Dois anos após o início do desenho do projeto, em 2012, o Ballet Paraisópolis abria as suas portas, atendendo a cem crianças na faixa etária de 8 a 12 anos, na União dos Moradores e do Comércio de Paraisópolis.

“A comunidade nos recebeu de braços abertos e, devagar, reconheceram a seriedade de nosso trabalho. Hoje, estamos com 200 crianças, sendo 197 meninas e três meninos, e contamos com uma fila de espera com mais de mil crianças”, afirma Monica.

As aulas do projeto são ministradas de segunda a sexta-feira, com duração de uma hora cada, e ao menos dois sábados por mês são realizados ensaios gerais para preparar alunas e alunos para as futuras apresentações.

Formando cidadãos

O ballet é uma atividade que mistura a sensibilidade da arte com a disciplina e rigidez do esporte. Para se tornar um bom bailarino, são necessárias horas e horas diárias de treinamento, uma dieta alimentar adequada e muita dedicação.

Por isso, muito mais do que futuros bailarinos, o projeto vem ajudando a formar cidadãos. Ao longo dos anos de formação do projeto, os alunos fazem aulas de dança contemporânea, participam de workshops com bailarinos profissionais, saem para assistir a apresentações de companhias de ballet renomadas de São Paulo, visitam pontos culturais, fazem oficinas de inglês, assistem a palestras sobre orientação sexual e hábitos alimentares, e muito mais. Tudo isso para formar bons bailarinos, mas também pessoas mais qualificadas e instruídas.

“O ballet é transformador, ele dá muita responsabilidade, organização e muda os hábitos alimentares das crianças. Mesmo que o jovem não queira seguir a carreira de bailarino, ele está qualificado para o mercado de trabalho, pois, como as exigências da dança são tantas, o profissional torna-se preparado para ter sucesso no mercado.”

E nesses quatro anos de projeto, Monica conta que se surpreendeu com os talentos que identificou, tanto para o ballet clássico como para o contemporâneo, e com a vontade de aprender que as crianças demonstram. Ela acredita que boa parte dos seus alunos conseguirá fazer a formação e poderá seguir carreira profissional. “Sou a pessoa mais realizada ao ver que consegui transformar e dar uma carreira para várias crianças. É motivo de muito orgulho e satisfação”, confessa.

Mas, apesar do sucesso do projeto, nem tudo são flores para Monica. O projeto ainda sofre com um espaço físico limitado e busca por novos patrocinadores (hoje o projeto é patrocinado pelo Itaú, por meio de leis de incentivo) para duplicar a quantidade de crianças beneficiadas. Porém, passo a passo, a bailarina acredita que conseguirá continuar alimentando o seu sonho e o das crianças. “Quero dar continuidade ao trabalho com ajuda dos patrocinadores. Em segundo lugar, fazer a formação plena e, em 2020, conseguir formar a companhia Ballet Paraisópolis”, revela.

A história da coreógrafa e do ballet já serviram de inspiração para uma recente novela da Rede Globo. Na obra “I Love Paraisópolis”, a atriz Françoise Forton interpretou Isolda, uma bailarina inspirada na vida real da bailarina. “Ela é nossa grande inspiradora”, disse Françoise Forton, em matéria publicada no Portal Terra, em junho de 2015.

E os alunos de Monica darão uma mostra de seus talentos, amanhã, dia 16 de julho, às 16 horas, em uma apresentação gratuita no Parque do Ibirapuera. O espetáculo Dançando com a Alma será uma mostra do trabalho realizado durante quatro anos de curso, composta por um divertissement com 24 coreografias nas modalidades dança contemporânea, ballet clássico, de repertórios e neoclássico. A apresentação contará ainda com a participação das bailarinas convidadas: Isabella Rodrigues (São Paulo Companhia de Dança) e Sofia Tarragó (Pavilhão D). Um programa para aqueles que apreciam o ballet ou, simplesmente, para quem quiser conhecer de perto uma bela história de amor pela arte e pelo próximo.

Que a voz de Monica continue ecoando pelos salões de ensaio do Projeto Paraisópolis e no coração das centenas de crianças que tiveram as cortinas de uma nova realidade abertas pela coreógrafa que lhes deu uma oportunidade de bilhar nos palcos da vida.

Busque seu propósito. Deixe seu legado.

Renata Spallicci

Ballet Paraisópolis – Nos Passos da Arte, é um videodocumentário que apresenta o projeto dentro de uma das maiores comunidades de São Paulo, publicado por Jéssica Rodrigues, em 18/09/2015, assista: