Em sintonia com o público - Iafa Britz

Fonte: Valor Econômico, por Lígia Nogueira, em 24/11/2014

Iafa Britz é a produtora responsável pelos maiores sucessos de bilheteria do cinema brasileiro nos últimos anosIafa Britz não dá autógrafos nem recebe pedidos de "selfies", mas seu nome aparece com destaque nos créditos de alguns dos filmes e séries de maior sucesso no Brasil nos últimos tempos. À frente da Migdal Filmes, a carioca de 43 anos é responsável pela produção de títulos como "Minha Mãe É uma Peça - O Filme", brasileiro mais visto no país em 2013 e que teve também a maior bilheteria no ano passado.

A adaptação do espetáculo teatral protagonizada pelo ator Paulo Gustavo e dirigida por André Pellenz teve mais de 4,5 milhões de espectadores e faturou R$ 49,5 milhões. É mérito da produtora ter levado às telas outro êxito de público, "Nosso Lar" (2010). Baseado no best-seller de Chico Xavier (1910 -2002), o longa coproduzido pela Migdal e pela Globo Filmes ocupa o sétimo lugar no ranking dos filmes brasileiros mais vistos entre 2000 e 2013, com mais de 4 milhões de espectadores, segundo o Filme B, portal especializado no mercado de cinema no país.

"Cinema é um negócio arriscado", diz Iafa Britz, durante passagem pela capital paulista para a divulgação de "Irmã Dulce", filme produzido pela Migdal com estreia prevista para quinta-feira. Outros destaques que levam a assinatura da produtora e estreiam em breve nos cinemas são o documentário "Cássia", sobre a cantora Cássia Eller (1962-2001), com direção de Paulo Henrique Fontenelle, e "Casa Grande", filme de Fellipe Barbosa que ganhou o prêmio de melhor longa de ficção na escolha do público no Festival do Rio. "É uma atividade que envolve valores enormes, um esforço absurdo. Pode ser bastante lucrativa, mas você nunca sabe se vai dar certo ou não", diz a executiva, terceira de quatro irmãos criados em uma família judia do Rio de Janeiro.

Ela faz análise cautelosa do mercado para 2014, ano em que os números devem ficar abaixo dos de 2013, quando o cinema brasileiro bateu recorde (e as comédias marcaram forte presença). O ano passado foi marcado por mais de 120 estreias de produções nacionais e 26 milhões de ingressos vendidos, segundo a Ancine (Agência Nacional de Cinema). Foi o melhor ano da indústria audiovisual nacional desde a "retomada", nos anos 90. A arrecadação obteve um crescimento significativo ao superar os R$ 270 milhões - em 2012, o retorno no setor foi de R$ 157 milhões.

Com direção de Vicente Amorim, roteiro de Anna Muylaert e as atrizes Bianca Comparato e Regina Braga dividindo o papel principal, "Irmã Dulce" chega ao circuito em um período em que as comédias dominam as bilheterias. Em contrapartida, a cinebiografia da religiosa baiana beatificada em 2011, nascida Maria Rita de Sousa Brito Lopes Pontes (1914-1992), tem todos os elementos para atrair o público. "É difícil saber qual será a reação das pessoas", diz Iafa, para quem o processo de produção do longa foi "motivador". "O filme tem uma mensagem positiva. Fiquei intrigada com a história daquela mulher que tinha 1,50m de altura e 30% da capacidade respiratória, numa época com muito mais limitações do que a que vivemos hoje."

A beata fundou em 1959 uma entidade que deu origem à Osid (Obras Sociais Irmã Dulce), hoje uma das maiores instituições filantrópicas do Brasil, com cerca de 4 milhões de atendimentos ambulatoriais por ano a usuários do SUS (Sistema Único de Saúde). Quando Bruno Wainer, da distribuidora Downtown Filmes, ligou para Iafa para contar sobre um projeto que havia chegado até ele, há cerca de quatro anos, os dois decidiram ir a Salvador para conhecer Maria Rita Pontes, sobrinha da religiosa e superintendente da Osid. "Ficamos impressionados com a força da obra de Irmã Dulce", diz Iafa, que retornou à cidade depois para acompanhar as filmagens. Durante a estadia, em um período de dedicação à produção, recebeu a visita dos pais e de seus filhos, Benjamin, de 7 anos, e Nicholas, 10.

Assista o trailer oficial de Irmã Dulce - O Filme

O diretor Vicente Amorim, de "Corações Sujos (2011) e "O Caminho das Nuvens" (2003), passou a integrar a equipe com a missão de filmar a história da heroína. "A gente tinha um namoro de vários anos que não podia se concretizar porque eu já era sócio de uma produtora e não tinha como trabalhar com ela", diz Amorim, definindo a parceira de trabalho como uma "máquina". "Iafa é uma produtora dinâmica, honesta, muito companheira do diretor do ponto de vista criativo, mas sem imposições irracionais que alguns produtores fazem", diz o cineasta. "Ela é uma produtora com conhecimento cinematográfico, de televisão, de dramaturgia. Uma parceira como poucos que tive nos meus quase 30 anos de cinema."

O "namoro" deu tão certo que Iafa convidou Amorim para ser diretor geral da segunda temporada da série "As Canalhas", exibida pelo canal pago GNT. A equipe se prepara agora para dar início, em dezembro, às filmagens da terceira temporada do programa. Além disso, Iafa vai trabalhar na cinebiografia da poeta carioca Ana Cristina Cesar (1952-1983), com direção de Amorim e Bianca Comparato no elenco, em uma coprodução da Migdal com a Samba Filmes, do Rio de Janeiro. "Tem outro projeto grande que vai ser rodado provavelmente no começo de 2016 e mais dois outros projetos de TV que a gente está desenvolvendo juntos", afirma o diretor.

A televisão por assinatura se tornou um nicho explorado pela Migdal desde a criação da empresa, em 2010, quando o segmento no Brasil teve um crescimento anual de 30,72%, com 9,76 milhões de assinantes. Em maio de 2014, esse número pulou para 17,9 milhões, segundo dados da ABTA (Associação Brasileira de Televisão por Assinatura) e da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). O conteúdo produzido especialmente para os canais a cabo vem acompanhando esse crescimento: se em 2010 os canais pagos exibiram 1.608 horas de conteúdo brasileiro, em 2013 foram 3.884 horas, segundo a ABPITV (Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão).

A lei da TV paga, que passou a vigorar em 2011 para garantir a presença de mais conteúdo nacional nos canais de TV por assinatura, ajudou a impulsionar o setor. "O mercado mudou muito nesse aspecto e temos de estar preparados para suprir essa demanda", diz Iafa. A Migdal tem um departamento específico para a criação e o desenvolvimento de projetos para televisão. "Para as TVs, a questão do preenchimento de grade é uma preocupação. Do ponto de vista dos produtores é uma questão de entendimento de como fornecer, financiar, suprir, entender a demanda, formar pessoas. É diferente do cinema. São orçamentos diferentes, posicionamentos diferentes", diz a executiva. "Hoje dá para perceber uma quantidade grande de produtoras novas chegando ao mercado, o que é uma coisa boa. Há novos diretores e atores despontando, pessoas que ficavam no teatro alternativo e que de repente estão virando estrelas na TV a cabo."

Segundo a Ancine, mais de 180 produções independentes foram lançadas depois de 2011. Para o presidente da ABPITV, Marco Altberg, "a lei veio para organizar melhor o que já estava em curso". "Antes disso a gente já vinha trabalhando a relação com os canais por assinatura e de TV aberta, os canais públicos e as novas mídias. O desenvolvimento do setor é resultado de todos os atores desse mercado", diz. A estimativa até 2017 é que o Brasil ocupe o sétimo lugar no ranking do mercado mundial em produção de conteúdo para TV paga, segundo a consultoria PricewaterhouseCoopers. "Estamos terminando um ano atribulado, com Copa do Mundo e eleições. Houve uma interferência externa muito forte que se refletiu em todos os setores da economia", diz Altberg. "Para o ano que vem esperamos um cenário mais tranquilo."

Além de "As Canalhas" (GNT), outras parcerias da Migdal com canais pagos têm rendido produtos reconhecidos pela audiência, como "220 Volts" e "Paulo Gustavo na Estrada", exibidos pelo Multishow - a série cômica "Alucinadas", baseada na peça teatral homônima, acaba de estrear no mesmo canal. Já a segunda temporada da série musical "Música.doc" vai ao ar pelo VH1 Brasil. "É duro emplacar essas coisas, são processos muito diferentes, outro tipo de relacionamento com o produto", diz Iafa. "O que ao mesmo tempo é legal, porque é tudo muito rápido, muito dinâmico. Você faz e de repente está ali. O resultado é imediato, e isso é prazeroso."

Os filmes e séries são viabilizados por meio de parcerias com TVs, fundos de investimento (como o Fundo Setorial do Audiovisual) e leis de incentivo. "Com relação aos filmes, ainda dependemos, e provavelmente vamos depender durante muito tempo ainda, de financiamento por meio das leis de incentivo", diz Iafa. "O fundo setorial é uma ferramenta absolutamente importante, que melhorou bastante nos últimos tempos." "As Canalhas" foi o primeiro programa produzido pela Migdal a ter o financiamento pelo Fundo Setorial de TV. As temporadas seguintes tiveram financiamentos diferentes.

Identificar um produto com potencial para fazer sucesso é uma questão de "feeling". "Ele tem de fazer sentido em todos os aspectos: do ponto de vista da história em si, tem de ser motivador, e do ponto de vista econômico, tem de ser consumido", diz. "Se a gente não estiver muito envolvido é difícil ter a motivação necessária para fazer acontecer, porque é preciso muita energia para levantar um projeto, seja de cinema ou de TV."

É preciso, também, saber perceber o momento em que um projeto deve ser engavetado. "Pode acontecer de perder o timing. A gente lamenta profundamente, mas tem de desapegar, isso acontece. O projeto tem um pouco de vida própria também", diz a produtora.

Iafa se envolveu com cinema ainda jovem, no fim dos anos 80, totalmente por acaso. Depois de ter passado um ano morando em um kibutz em Israel, ela estudava informática na PUC e estagiava no banco Pactual quando decidiu fazer um curso extra de computação gráfica. "Fui para a Fundição Progresso e lá entrei literalmente na sala errada", diz. "Era uma aula de produção de vídeo. Achei aquilo fascinante, mas não fazia ideia de que podia ser uma profissão."

O próximo ano será o momento de "dar uma refletida", diz Iafa. "Minha percepção é de que o público brasileiro, neste momento do país, quer um entretenimento mais fácil, mais leve. Daqui a dois anos pode estar diferente, como já esteve dois ou três anos atrás. Precisamos pensar agora no tipo de produto que vamos apresentar em 2015."

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